Entre porcos, cães e ovelhas: Análise semiótica da capa de Animals(1977)

      Em seu trabalho, o designer londrino Storm Thorgerson na capa de Animals(1977), retrata uma usina(Termoelétrica de Battersea) com um porco sobrevoando, que num exame mais atento, á luz da semiótica, consegue-se extrair possíveis interligações. Antes mesmo de ouvir suas músicas, é possível notar que a capa de Animals(1977) está profundamente de acordo com o conteúdo musical proposto pela banda e sua maior referência, o livro de George Orwell Animal Farm(A revolução dos bichos).

     A capa de Animals(1977), com o embasamento teórico da ciência responsável pelo processo gerativo de sentido, a semiótica, será interpretada à luz do método de análise de capa de discos de Antonio Vicente Pietroforte. A partir das respostas obtidas, será feita então uma análise das relações de sentido propostas pelo disco.

A revolução dos bichos, o livro

     Publicada em 1945, a distopia Revolução dos Bichos, de George Orwell relata o processo de rebelião dos animais numa fazenda. George Orwell relata em sua obra toda a estática humana, na qual o homem não consegue mudar o modo de se viver dentro de uma sociedade. 

     O autor, através de metáforas satiriza grandes personalidades do Socialismo (como Trotsky e Stalin) e o comportamento da sociedade de forma generalizada. Animal Farm é considerado um texto distópico por retratar um mundo emque os personagensprocuram uma sociedade perfeita ou utópica, porém, resultando num mundo ainda pior.

  Semiótica greimasiana

       Pietroforte, em seu livro A construção da imagem (2007), ressalta que: analisar semioticamente uma capa de disco, pressupõe antes, defini la como texto, considerando o visual gráfico como um substrato da articulação entre o plano de conteúdo com o plano de expressão. Qual o conteúdo de Animals(1977)?

        Considerando a produção de sentido de um texto, como um percurso que vai do mais simples e profundo, ao mais superficial e complexo por meio de categorias que são elas: topológicas, cromáticas e eidéticas, a semiótica plástica se mostra como uma recusa entre o visível e o descritível, evitando uma lexicalização dos textos visuais.

        Esta manifestação de sentido por termos contrários, pode por meio de afirmação e negação, ser semioticamente observada por meio de três categorias: topológicas(responsáveis pela manifestação da distribuição dos elementos figurativizados), as  cromáticas(responsáveis pela manifestação por meio da cor) e as categorias eidéticas (responsáveis pela manifestação por meio da forma).

        

 Análise semiótica da capa de Animals(1977)

        É num olhar mais atento que percebemos não se tratar apenas de uma simples foto com uma indústria e um porco sobrevoando em meio a duas torres sobre nuvens escuras, mas de algo prestes a acontecer quando o disco for tocado.  Pietroforte em seu livro, A construção da imagem(2007, pg.21), ressalta que ‘’ao fazer parte de um texto maior, a foto integra a capa de um determinado álbum e é nessa rede de relações, formada pelas conotações sociais investidas na capa e nas músicas, que é então gerado o sentido.

Fonte: https://www.google.com.br/search?q=animals. Acesso em 14 Jan. 2018.  

        É quando há uma relação entre forma de expressão e forma de conteúdo que se desenvolvem os eixos paradigmáticos de cada forma. Para exemplificar, percebemos que, se num velório as pessoas utilizam preto para indicar morte e, por outro lado, num nascimento ou outra celebração do mesmo tipo utilizam branco, concluímos que: a projeção no eixo sintagmático acontece na relação entre os paradigmas da forma de expressão e categorias de conteúdo. Logo, as cores preto e branco fariam parte da forma de expressão para que sejam gerados os sentidos vida vs morte, na forma conteúdo.

       Storm Thorgerson, lançando mão da imagem da usina termoelétrica de Battersea com um porco sobrevoando, se utiliza de uma estratégia semiótica, semi-simbólica e também poética: semi-simbólica, pois, formas de expressão se relacionam com formas de conteúdo e, também poética, pois o eixo paradigmático destas categorias é formado no próprio eixo sintagmático que as promove.

           

 Análise das letras do álbum

      As letras das canções por fazerem parte de nossas vidas, servem de excelente material de pesquisa, se levar em consideração que não precisamos exatamente nos ater às etapas de compreensão direta do texto em si. Para TATIT(2001, p.15) ‘’A superficialidade de um texto é onde se acomodam suas grandezas expressas’’.

       O olhar semiótico se encarrega justamente de atravessar essas grandezas,se debruçando por meios descritivos que podem ser de ordem:actancial, modalou tensiva, bem como suas interações sintáticas como propõe ZILBERBERG (2006, p.9) ‘’A semiótica que se concentra em grandezas, até então julgadas inferiores, seriam as grandezas afetivas’’. TATIT (2001) destaca também que essas grandezas, observadas pelo olhar semiótico descrito acima, constituem um microuniverso semântico, um norte para a atividade descritiva, com o objetivo de se revelar uma ‘’forma semiótica’’(constância numa manifestação, como disse Louis Hjelmslev).

       Sendo uma frase uma seqüência de pensamentos que, em conjunto conseguem exprimir outro determinado pensamento, é pela análise que percebemos dessa forma semiótica se tratar de um sistema complexo com elos subjacentes, fazendo a ligação entre determinadas palavras escolhidas.

        Ao ouvirmos, por exemplo, no trecho da letra Dogs:

And when you lose control

You'll reap the harvest you have sown

em que Waters cria elos entre determinadas palavras, sendo elas ‘’controls” e ‘’Sown’’.

      A passagem também faz alusão a obra de George Orwell, Animal Farm.(1945),  retratando seres humanos em categorias animalescas, em que os personagens principais são os; cães(Dogs) como os repressores, aqueles que pelas ordens de outros animais usam seu poder sobre os outros, os porcos (Pigs) como os que detêm o poder e controlam as massas e, por fim, as ovelhas (Sheep), representando o proletariado, aqueles que sem contestar aceitam sua realidade, subservientes e inertes a todo e qualquer pensamento contrário.

       Outro exemplo de utilização de elos subjacentes aparece no trecho de Pigs(Three different ones):

What a surprise!

A look of terminal shock in your eyes

Now things are really they seem

No, this is not bad dream

as palavras escolhidas, nesse caso ‘’surprise’’, ‘’eyes’’(substantivos) das duas primeiras estrofes, fazem um paralelo sonoro em comparação as duas últimas estrofes ‘’seem’’ e ‘’dream’’(verbos). Percebo que intencionalmente, os elos subjacentes neste trecho de Pigs(Three different ones) se referem a algum tipo de choque de realidade ou algo como despertar para uma dada e hostil realidade.

      È possível perceber que as quatro estrofes incidem sobre o mesmo objeto, ocasionando uma espécie de continuum, em que nas primeiras duas estrofes é surgida a pergunta para que nas duas últimas, seja reafirmada a proposta da estrofe em questão, que nesse caso, seria uma cruel realidade.

 ¹ Faculdade de Letras, UFAL, Maceió, AL. Email: charlesarts@live.com